JORGE RODRIGUES SIMAO

ADVOCACI NASCUNT, UR JUDICES SIUNT

A contradição dos provérbios

Provérbios e ditados populares - Língua Portuguesa (Video)

Provérbios e Ditados Populares

PROVERBIOS

Os provérbios que se transmitem de geração em geração, há centenas de anos, são loquazes na sabedoria que contém, sendo muitas das vezes contraditórios, e se bem analisados, não acabam por de outra forma atingir o mesmo fim. Senão vejamos, os seguintes provérbios…Mais vale quem Deus ajuda do que quem cedo madruga e … Deus ajuda quem cedo madruga.

 

Todos o dissemos, ouvimos e possivelmente pusemos em prática. A sabedoria popular diz que agir com celeridade nos trará possibilidades acrescentadas de conseguirmos um bom resultado. Não por muito madrugar, amanhece mais temporão. Sem dúvida, o escutámos e utilizámos.

É outra frase que reflecte a sabedoria popular e que significa que não é bom apressarmo-nos, porque não assegura um bom resultado. Os seres humanos empanturram-se deste tipo de frases que repetimos como princípios quando não são mais do que ideias gerais que no fundo, e por si sós, não dizem nada.

Ninguém pode dizer que é sempre bom apressar-se, nem que é sempre bom esperar. No entanto, ambos os provérbios são contraditórios. Um sugere actuar rápido e o outro não se apressar. Como podem ser ambos sábios ao mesmo tempo se dizem exactamente o contrário?

Este tipo de frases não podem ser elevadas ao nível de axiomas ou princípios que têm de ser aceites sem necessidade de demonstração. Não são, em si, nem verdadeiros nem falsos. O seu valor depende das circunstâncias em que são aplicados.

Uma das frases comuns, muito usadas em todo tipo de debate (político, económico, científico, etc.) é de que “os extremos nunca são bons”. Se alvitras uma posição em defesa de alguma liberdade e em contrário de alguma forma de intervenção, a postura é equivocada, simplesmente, porque é extrema.

A verdade é que os extremos, em (não poucas) ocasiões, podem ser a melhor alternativa. Em outras quiçá não. Dizer que simplesmente algo é mau porque é extremo, é uma generalização que trata de converter uma frase popular em axioma. Não se pode dizer que a água a ferver não é boa. Também não se pode dizer que a água gelada é má. São extremos, mas isso não significa apenas que a água morna é aceitável. Para cozinhar um ovo, a água a ferver é a melhor alternativa.

A água gelada é para refrescar e a água morna para tomar um banho. O morno também não foi tratado muito bem pelas “frases populares”, pois, “O quente e o frio engolirei, mas o morno cuspirei da minha boca”, reza o livro do Apocalipse. Nem as frases bíblicas se salvam de ter que ser colocadas no contexto. O que ocorre é que o termo “morno” costuma ser cómodo. Permite-te criticar ambos os lados de qualquer equação, parecendo equânime ou centralizado e ser politicamente correcto. Mas muitas vezes significa, também, que alguém simplesmente, não quer definir-se ou que não tem uma atitude.

Muitas vezes conduz ou reflecte inacção ou resistência à mudança. De facto, outra frase comum propõe as bondades do extremismo: “Problemas extremos, soluções extremas”. E também pode ser correcta segundo as circunstâncias, ou é de crer que combater a corrupção ou a violação de menores com indiferença é uma boa alternativa? Outra frase similar é “não confundir liberdade com libertinagem”.

Esta é outra forma singela de criticar a quem crê que só a liberdade garante a autêntica dignidade do homem. No entanto, para quem entende a liberdade nesse sentido não existe liberdade sem responsabilidade, isto é, sem o sentido de assumir as consequências dos seus actos.

Nunca tive por muito claro o que significa “libertinagem” nesse contexto, mas entendo que um libertino é quem actua em oposição à lei ou à ética. Uma prostituta não deixa de ser libertina pelo facto de vender o que é seu. É uma liberdade irresponsável, o que em sentido liberal não é autêntica liberdade.

Muitas frases fáceis fazem que confundamos a singeleza de uma ideia com a sua contundência. O verdadeiro é que soar bem não faz que a frase seja verdadeira. O dito de que “os extremos são sempre maus” não é por si só um argumento, da mesma forma que os extremos são bons, também não o é. Finalmente, como bem dizia Karl Hess, “o extremismo na busca da liberdade não é vício.

A moderação na busca de justiça não é virtude”. Os seres humanos enchem-se deste tipo de frases que repetimos como princípios quando não são mais do que ideias tão gerais de que no fundo, por si sós, não dizem nada.

 

 

JRS. 05.02.2015
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